quarta-feira, 12 de dezembro de 2012
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Dor
Se você
atravessar um prego no dedo dói, se um caminhão passar em cima de você dói, se
você cair e bater com a cara no chão também dói. Considerando todos esses fatos
podemos traçar uma linha de causalidade. O dedo dói por causa do prego, logo é
necessário tratar do ferimento e evitar os perigos relacionados a esse tipo de
dor.
Quando se
trata de uma dor que não pode ser vista é diferente.
Explique-se,
se puder: “É que dói, onde? Não sei, é bem aqui, mas aqui onde eu não sei
explicar, mas eu sinto.”
E para dor
escondida há tantos que querem explicar... nobres companheiros da literatura, é
claro que eles também sangraram. Sei bem a dor de Kerouac em “Os subterrâneos” (eu queria mesmo me machucar e me “lacerar’ – mais
uma laceração e vão ter que preparar o caixão para mim rapaz), e
também o sofrimento de Erica Jong em “Medo de voar” e tantos outros que
choraram naquela mesma esquina que eu e tentaram achar explicação. Então eu penso em coisas, penso em teorias, reflito sobre romances para entender meu próprio
sofrimento com aquele ferro enferrujado machucando em algum lugar.
E sim, eu preciso de uma explicação para dor. Se os fatores envolvidos nessa 'dor' tiverem uma ordem lógica posso romper com isso, mas aí esqueço que 'essas coisas' acontecem com uma lógica um tanto distante das 'outras coisas' observáveis...
E então falo com qualquer pessoa, pode ser aquela que leu Dostoiévski, Schopenhauer e tudo mais, "Charles Bukowski me entenderia". Clarice
Lispector até, ou melhor frases de auto-ajuda da Clarice Lispector. Ou melhor
ainda, um livro de auto-ajuda. Filosofia talvez, metafísica, psicologia... Skinner não me entenderia. Freud talvez.
sábado, 24 de novembro de 2012
Silêncio
Eu aprecio
o silêncio
Gosto de
olhares que se cruzam sem palavras
Eu amo a
serenidade
A densidade
da brisa é tão bonita
A presença
sem barulho
Eu sinto
tanto
Fico quieta
Só o meu
coração canta
O som dele é
mais bonito e alto
Tempestades,
furacões, vulcões em erupção... tudo isso aconteceu
E tudo o
que eu disse foi: “Fica!”
Sem que uma
palavra fosse dita
Dizem que a
coragem é vermelha
Discordo,
eu a descobri
Ela tem a
cor da vontade de ir
Pulsação,
circulação e ritmo
A mesma cor
do bater de asas do beija flor
Não entendeu o que eu disse?
Gosto de você e farei com que você fique
Mas sem pronunciar uma palavra.
sábado, 10 de novembro de 2012
F. Scott Fitzgerald
Ludwik de Laveaux, Parisian Street at Night |
E assim prosseguimos, botes contra a corrente, impelidos incessantemente para o passado.
[O Grande Gatsby]
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
Fabio Herrmann
Ora, a
posse integral de si próprio é impossível – por sorte, posto que, satisfeito,
cada homem seria o último da Terra, sem descendência, nem haveria obras ou
civilização. Somos muito dependentes do meio e da sociedade e, além disso, não
nos conseguimos conhecer diretamente: só no confronto com os outros é que
sabemos de nós. Conformar-se com isso? Bem, não há outro jeito. Porém, ainda
que aceitando a indispensável abertura para o outro, resta sempre um sentimento
de perda, básico e inevitável, como uma saudade de si mesmo, embora referente a
um estado de posse absoluta que nunca houve ou haverá. Será irracional talvez,
mas os homens são assim, nostálgicos precisamente do que tão-somente imaginaram
haver possuído.
[Trecho de "O que é psicanálise"]
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
City of Blinding Lights
Eu vi a noite cair na cidade grande há alguns anos atrás... sorrateiramente. Vi os carros disputarem espaço no entardecer, os camelôs se recolherem, a luz do sol de outono esvair-se lentamente, enquanto a noite envolvesse a cidade e instigasse mistério a todos os movimentos envoltos em seu turno. As moças das lojas ainda maquiadas no ponto de ônibus pra voltar pra casa, a manicure que havia atendido sua última cliente, as lojas fechando...
Um ritmo naturalmente pulsante que envolve as alterações de períodos e tantos ciclos interligados, como se todas as pessoas reproduzissem uma coreografia em conjunto. Intimamente eu divagava que todos nós estaríamos dançando sozinhos em sintonia. Vi um cara chegar totalmente desalinhado em um bar com aparência descuidada, ele se embebedou, jogou sinuca ao som de 'Bom Senso' de Tim Maia, depois ele deitou na mesa de bilhar e dormiu, supostamente era amigo do dono do bar. Vi uma garota de programa aparentando menos de 30 anos andar na rua com seu salto e suas roupas curtas, blasé ela parou na esquina e esperou. Vi um gari com sua roupa laranja, ele usava uma aliança. Provavelmente sua mulher estaria em casa assistindo o fim da novela das nove e desejaria solitariamente que o seu marido tivesse um trabalho que coincidisse com o horário do seu, então ela se lembra de sua amiga que reclama que o marido chega e bagunça a casa toda, mas ela sabe que com ela não aconteceria isso. Porque nas noites ele cruza ruas carregando sacolas de lixo, e faria isso mil vezes por ela e por seu bebê. Eu vi o malandro, eu leria mais tarde num livro de Jorge Amado que ninguém ama mais a cidade que os malandros, e aquele parecia familiarizado com a noite, com o dia e parecia viver do mesmo jeito que corria: agilmente, rapidamente e sem olhar pra trás. Eu vi as árvores sombrias e velhas, as sombras durante o dia e confidentes noturnas. As espectadoras silenciosas que assistiam tantos destinos, tantas vidas, tantos mundos, tantas percepções. Eu pensei em todos eles, pensei no sonho deles. Eu penso nos meus sonhos. Ás vezes eu tenho medo antes de dormir, mas aquela noite eu passei em claro por causa de um velório. À noite na cidade grande com luzes, outdoors de produtos que se tornariam obsoletos na próxima estação, as vitrines, os táxis, o concreto. Pensei em todas as probabilidades de muitas coisas, percebi que se tentasse fazer uma coisa fracassada mais uma vez a segunda vez poderia falhar como na primeira e eu perderia tempo, mas percebi que poderia tentar algo importante até conseguir, porque o tempo me faria mudar. Eu percebi o movimento, a coreografia, desejei ter alguém com quem pudesse andar sobre aquelas calçadas iluminadas pelas luzes e por sonhos, alguém...
postado em 05/08/2011
Um ritmo naturalmente pulsante que envolve as alterações de períodos e tantos ciclos interligados, como se todas as pessoas reproduzissem uma coreografia em conjunto. Intimamente eu divagava que todos nós estaríamos dançando sozinhos em sintonia. Vi um cara chegar totalmente desalinhado em um bar com aparência descuidada, ele se embebedou, jogou sinuca ao som de 'Bom Senso' de Tim Maia, depois ele deitou na mesa de bilhar e dormiu, supostamente era amigo do dono do bar. Vi uma garota de programa aparentando menos de 30 anos andar na rua com seu salto e suas roupas curtas, blasé ela parou na esquina e esperou. Vi um gari com sua roupa laranja, ele usava uma aliança. Provavelmente sua mulher estaria em casa assistindo o fim da novela das nove e desejaria solitariamente que o seu marido tivesse um trabalho que coincidisse com o horário do seu, então ela se lembra de sua amiga que reclama que o marido chega e bagunça a casa toda, mas ela sabe que com ela não aconteceria isso. Porque nas noites ele cruza ruas carregando sacolas de lixo, e faria isso mil vezes por ela e por seu bebê. Eu vi o malandro, eu leria mais tarde num livro de Jorge Amado que ninguém ama mais a cidade que os malandros, e aquele parecia familiarizado com a noite, com o dia e parecia viver do mesmo jeito que corria: agilmente, rapidamente e sem olhar pra trás. Eu vi as árvores sombrias e velhas, as sombras durante o dia e confidentes noturnas. As espectadoras silenciosas que assistiam tantos destinos, tantas vidas, tantos mundos, tantas percepções. Eu pensei em todos eles, pensei no sonho deles. Eu penso nos meus sonhos. Ás vezes eu tenho medo antes de dormir, mas aquela noite eu passei em claro por causa de um velório. À noite na cidade grande com luzes, outdoors de produtos que se tornariam obsoletos na próxima estação, as vitrines, os táxis, o concreto. Pensei em todas as probabilidades de muitas coisas, percebi que se tentasse fazer uma coisa fracassada mais uma vez a segunda vez poderia falhar como na primeira e eu perderia tempo, mas percebi que poderia tentar algo importante até conseguir, porque o tempo me faria mudar. Eu percebi o movimento, a coreografia, desejei ter alguém com quem pudesse andar sobre aquelas calçadas iluminadas pelas luzes e por sonhos, alguém...
postado em 05/08/2011
terça-feira, 23 de outubro de 2012
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Gavetas
"Ah, se eu pudesse me arrumar por dentro, tudo calminho nas gavetas." Lygia Fagundes Telles
Alfred era um conhecido vendedor de gavetas. Vendia gavetas na região boêmia da cidade. Sua loja ficava entre um supermercado e uma loja de armas.
Seu negócio era rentável, muitas pessoas o procuravam para comprar gavetas que pudessem guardar memórias, as mais velhas gostavam de catalogar suas memórias, por isso, compravam várias gavetas para montar uma cômoda em casa. Outras mais precavidas conectavam um pen drive à gaveta pra salvar as memórias no computador, eventualmente enviavam aos amigos. Mas, muitos gostavam da relação romântica com a gaveta, apenas salvavam a memória lá e costumavam abrir sozinhos para sentir o mesmo sabor, o mesmo cheiro. Era como se entrassem em um Universo Paralelo, era como se o passado ainda estivesse acontecendo em um lugar muito distante. Algo mais apurado que a nostalgia. Viam os fatos como realmente aconteceram e se espantavam com a atual percepção que tinham. Compravam novas gavetas e salvavam novas memórias.
Mas havia um caso mais extremo. Aqueles que compravam gavetas necessariamente pra "se livrar" de memórias, esquecer sentimentos. Alfred foi o pioneiro nisso.
Inventou o sofisticado sistema de engavetamento quando estava sofrendo por amor.
Já tinha tentado de tudo, um dia descobriu uma forma de transferir o que sentia ao objeto com certas especificidades que ele havia feito: uma gaveta especial! Não era apenas salvar memórias, era pôr ela nas gavetas, só nas gavetas pra não se recordar mais.
Ele pôs tudo o que sentia numa gaveta. Não salvou em pen drive, nem colocou a gaveta numa cômoda. Pegou o objeto e o incinerou.
Mas na cidade onde viveu, Alfred era apenas um conhecido vendedor de gavetas;
postado em 27/06/2011
domingo, 21 de outubro de 2012
Paul
RS: Você tem idéia do que continua a tocar as pessoas com os Beatles depois de todos esses anos?
Paul McCartney: Acho que, basicamente, é a magia. Os Beatles eram mágicos. Para mim, a vida é um campo de energia, um punhado de moléculas. E essas moléculas específicas se formaram para que aqueles quatro caras virassem os Beatles e fizessem todo aquele trabalho. Preciso pensar que foi algo metafísico. Uma coisa que deve ser considerada mágica. Estou sendo muito extravagante? Se você quiser ser prático, acho que as músicas eram muito bem estruturadas. Quando as canto atualmente em shows, penso: “Isso aí é bom, é sim. Que verso bom. Ah, entendi!”. É uma redescoberta. Você simplesmente lembra: “Ah, foi por isso que fiz assim”. Então, elas também têm uma força física, é trabalho bem-feito
sábado, 20 de outubro de 2012
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
Simone de Beauvoir
"Havia
muita verdade na observação que um dia Nadine me fez: 'Nunca você se
incorpora à situação.' Eu observava as
pessoas com olhos de médica, o que me dificultava ter com elas relações
humanas. A cólera, o rancor... raramente sou capaz disso. E os bons sentimentos
que me demonstram não me sensibilizam. É de meu ofício suscitá-los. Devo
suportar com indiferença os resultados das transferências que opero e
liquidá-los no momento exato. Conservo essa atitude, inclusive na vida
particular. Conquistado o paciente, diagnostico logo suas perturbações
infantis, vejo-me tal como aparecia em seus fantasmas: mãe, avó, irmã, filha,
ídolo. Não aprecio muito as feitiçarias que me atribuem, mas devo resignar-me a
isso. Suponho que, se algum dia um indivíduo normal tivesse o capricho de
prender-se a mim, logo eu me perguntaria: Que será que ele vê em minha pessoa? A que desejos frustrados está procurando satisfazer? E seria incapaz do menor
impulso.”
(Anne Dubreuilh, psicanalista em "Os Mandarins")
(Anne Dubreuilh, psicanalista em "Os Mandarins")
terça-feira, 9 de outubro de 2012
A cura do fogo
é queimar, queimar e queimar
incinerar o que estiver pelo caminho
é tornar pó
é transformar;
transmutar!
incinerar o que estiver pelo caminho
é tornar pó
é transformar;
transmutar!
Liberdade [3]
Não é fuga. É coragem. Só agora eu vejo que estava certa quando evitava que meu coração se desse ao desfrute de sentimentos efêmeros. Destes, a paixão o mais devastador. E só agora eu me dou conta que pertenço ao clube dos solitários.
Ah, os solitários....
Eles não são antipáticos ou amargos, ao contrário eles sentem uma simpatia natural pelas sutilezas. Admiram o céu e o pôr-do-sol, os detalhes...
Ninguém ama como os solitários, eles oferecem todo o amor que podem e guardaram nos dias serenos em que contemplaram a própria sombra. Quem é só não se entrega á toa, pois tem consciência que é tudo o que tem. Eles são verdadeiros em relação aos sentimentos e não são carentes. Não se 'penduram' em ninguém para enfrentar os dias nebulosos. Os solitários podem constantemente mudar de opinião, mas nunca 'forçados' à isso, é impossível 'colonizar' um solitário. Nem mesmo a paixão por mais intensa que seja pode fazer um solitário convicto mudar o caminho, no máximo uma confusão passageira.
Solitários são sensíveis e demoram para abrir mão de sua fiel companheira - a solidão -, para dar espaço a outra pessoa.
Solitários são juízes que julgam-se o tempo todo em prol de uma consciência tranquila, pois sabem que muitas vezes esta é a única companhia que possuem e precisa ser silenciosa. Solitários não parecem solitários por que são os melhores amigos que alguém pode ter. Solitários tendem a esconder-se das relações ou do apego por que isso subverte grande parte da filosofia anterior e quando isso acontece pode ocasionar sofrimento com o fracasso da relação, e, é doloroso voltar aos dias 'sozinhos', mas apesar disso eles não guardam mágoa, afinal eles sabem que andam livres e não podem ficar retidos no passado.
Mesmo que ás vezes tenham que andar no escuro, atravessar madrugadas e superar as cinzas porque só podem passar por isso porque são feitos de luz.
Sentei por alguns minutos no escuro com meus arrependimentos e sonhos, tenho aquela sensação de que espero alguém chegar, ou melhor 'não chegue agora', estou ainda recolhendo fragmentos de uma catástrofe recente. Será que é verdade aquele clichê que você um dia conhece alguém que pode mudar sua vida? Eu sei que já passei da idade de acreditar no amor...
Ah, os solitários....
Eles não são antipáticos ou amargos, ao contrário eles sentem uma simpatia natural pelas sutilezas. Admiram o céu e o pôr-do-sol, os detalhes...
Ninguém ama como os solitários, eles oferecem todo o amor que podem e guardaram nos dias serenos em que contemplaram a própria sombra. Quem é só não se entrega á toa, pois tem consciência que é tudo o que tem. Eles são verdadeiros em relação aos sentimentos e não são carentes. Não se 'penduram' em ninguém para enfrentar os dias nebulosos. Os solitários podem constantemente mudar de opinião, mas nunca 'forçados' à isso, é impossível 'colonizar' um solitário. Nem mesmo a paixão por mais intensa que seja pode fazer um solitário convicto mudar o caminho, no máximo uma confusão passageira.
Solitários são sensíveis e demoram para abrir mão de sua fiel companheira - a solidão -, para dar espaço a outra pessoa.
Solitários são juízes que julgam-se o tempo todo em prol de uma consciência tranquila, pois sabem que muitas vezes esta é a única companhia que possuem e precisa ser silenciosa. Solitários não parecem solitários por que são os melhores amigos que alguém pode ter. Solitários tendem a esconder-se das relações ou do apego por que isso subverte grande parte da filosofia anterior e quando isso acontece pode ocasionar sofrimento com o fracasso da relação, e, é doloroso voltar aos dias 'sozinhos', mas apesar disso eles não guardam mágoa, afinal eles sabem que andam livres e não podem ficar retidos no passado.
Mesmo que ás vezes tenham que andar no escuro, atravessar madrugadas e superar as cinzas porque só podem passar por isso porque são feitos de luz.
Sentei por alguns minutos no escuro com meus arrependimentos e sonhos, tenho aquela sensação de que espero alguém chegar, ou melhor 'não chegue agora', estou ainda recolhendo fragmentos de uma catástrofe recente. Será que é verdade aquele clichê que você um dia conhece alguém que pode mudar sua vida? Eu sei que já passei da idade de acreditar no amor...
domingo, 2 de setembro de 2012
quinta-feira, 30 de agosto de 2012
Gabriel García Márquez
Trechos de "Memória de Minhas Putas Tristes"
“...
da mesma forma que os fatos reais são esquecidos, também alguns que nunca
aconteceram podem estar na lembrança como se tivessem acontecido.”
“Nunca
esqueci seu olhar sombrio enquanto tomávamos o café da manhã: Por que você me
conheceu tão velho? Respondi com a verdade: A idade não é a que a gente tem,
mas a que a gente sente. Desde então a tive na memória com tamanha nitidez que
fazia dela o que queria.”
“Graças a ela enfrentei
pela primeira vez meu ser natural enquanto transcorriam meus noventa anos.
Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu
tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em
ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para
ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por
virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para
encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade
sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às
minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco
me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma
e sim um signo do zodíaco.”
“Virei
outro. Tratei de reler os clássicos que me mandaram ler na adolescência, e não
aguentei. Mergulhei nas letras românticas que tanto repudiei quando minha mãe
quis me forçar a ler e gostar, e através delas tomei consciência de que a força
invencível que impulsionou o mundo não foram os amores felizes e sim os
contrariados. Quando meus gostos musicais entraram em crise me descobri
atrasado e velho, e abri meu coração às delícias do acaso.”
“Não
se engane: os loucos mansos se antecipam ao porvir.”
“O
sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança.”
“Havia achado, sempre,
que morrer de amor não era outra coisa além de uma licença poética. Naquela
tarde, de regresso para casa outra vez, sem o gato e sem ela, comprovei que não
apenas era possível, mas que eu mesmo, velho e sem ninguém, estava morrendo de
amor. E também percebi que era válida a verdade contrária: não trocaria por
nada neste mundo as delícias do meu desassossego. Havia perdido mais de quinze
anos tratando de traduzir os cantos de Leopardi, e só naquela tarde os senti a
fundo”
“Ai
de mim, se for amor, como atormenta.”
“De verdade, terminou
ela com a alma: não vá morrer sem experimentar a maravilha de trepar com amor.”
“Era enfim á vida real,
com meu coração a salvo, e condenado a morrer de bom amor na agonia feliz de
qualquer dia depois dos meus cem anos.”
quinta-feira, 16 de agosto de 2012
Charles Bukowski [II]
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica aí dentro,
não vou deixar
ninguém ver-te.
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu despejo whisky para cima dele
e inalo fumo de cigarros
e as putas e os empregados de bar
e os funcionários da mercearia
nunca saberão
que ele se encontra
lá dentro.
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica escondido,
queres arruinar-me?
queres foder-me o
meu trabalho?
queres arruinar
as minhas vendas de livros
na Europa?
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu sou demasiado esperto,
só o deixo sair à noite
por vezes
quando todos estão a dormir.
digo-lhe, eu sei que estás aí,
por isso
não estejas triste.
depois,
coloco-o de volta,
mas ele canta um pouco lá dentro,
não o deixei morrer de todo
e dormimos juntos
assim
com o nosso
pacto secreto
e é bom o suficiente
para fazer um homem chorar,
mas eu não choro,
e tu?
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica aí dentro,
não vou deixar
ninguém ver-te.
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu despejo whisky para cima dele
e inalo fumo de cigarros
e as putas e os empregados de bar
e os funcionários da mercearia
nunca saberão
que ele se encontra
lá dentro.
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica escondido,
queres arruinar-me?
queres foder-me o
meu trabalho?
queres arruinar
as minhas vendas de livros
na Europa?
há um pássaro azul no meu coração
que quer sair
mas eu sou demasiado esperto,
só o deixo sair à noite
por vezes
quando todos estão a dormir.
digo-lhe, eu sei que estás aí,
por isso
não estejas triste.
depois,
coloco-o de volta,
mas ele canta um pouco lá dentro,
não o deixei morrer de todo
e dormimos juntos
assim
com o nosso
pacto secreto
e é bom o suficiente
para fazer um homem chorar,
mas eu não choro,
e tu?
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
Procura-se
Alguém que goste de tomar café, alguém que goste de meditar sobre a vida e seu sentido. Procura-se alguém com sinceridade afiada e talvez desastrado ás vezes, "quebrou o copo, mas nem tem como me chatear, é desastrado!". Procura-se alguém que me saiba, mas que não me desmascare. Procura-se alguém com toque leve e persistente, alguém com calma e serenidade sem perder a intensidade. Procura-se alguém que chegue na primavera e permaneça no verão e também no outono, e depois se cubra perto de mim no inverno e, quando eu perceber já passaram várias primaveras, vários verões e outonos e invernos e ele continua lá, e nós poderemos falar sobre uma primavera de décadas atrás andando de braços dados porque sobrevivemos, vivemos juntos e ficamos sentidos quando o Caetano morreu. Procura-se alguém que goste de ler, que goste do pôr-do-sol, e de... Rock, samba, MPB. Alguém que ri das minhas piadas, e alguém que saiba cozinhar bem, muito bem, e que goste de comer sentado no sofá. Procura-se alguém que me faça entender que a vida é divina, e que vale a pena confiar e “Minha nossa, eu tenho um lugar para voltar, vou correr e dizer mais uma vez para você que vale a pena!”. Procura-se alguém que aprecie a solidão, alguém que goste de dividir a solidão e depois ficar um tempo só para lembrar como é bom ter uma conexão com alguém e já não se sentir mais tão só no mundo. E então, nesses instantes solitários, nossos silêncios serão cobertos por aquele mistério, talvez isso chamem amor, mas só talvez porque devo admitir que já não me interessa saber o que é, desde que eu possa sentir e passar por isso.
Mas,
enquanto isso tudo não chega vou estar por aí imaginando histórias, fantasiando, lendo, aproveitando as coisas efêmeras pelo caminho, mas claro que sempre quando eu vir um rosto estranho na penumbra vou imaginar "talvez seja ele quem eu estava esperando". Pode ser que muitas vezes eu imagine na ressaca que isso é ilusão, mas eu sei, eu sei que eu vou encontrar.
"Esta é a graça dos pássaros, cantam enquanto esperam." Henriqueta Lisboa
sábado, 21 de julho de 2012
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Erica Jong
Trecho de "Medo de voar"
“Não existe
meio de sair da mente?”, indaga Sylvia Plath em um de seus últimos poemas
desesperados. Se eu estava aprisionada, era por meus próprios receios. Motivando
tudo aquilo existia o terror de estar sozinha. Ás vezes parecia que me prestava
fazer qualquer acordo, tolerar qualquer ignomínia, ficar com qualquer homem, só
para não ficar sozinha. Mas por quê? O que era tão terrível em estar só? Procure pensar nos motivos, dizia a mim mesma. Procure:
Eu: - Por
que é tão terrível estar só?
Eu: -
Porque se nenhum homem me ama, não tenho identidade.
Eu: - Mas
isso, evidentemente, não é verdade. Você escreve, as pessoas lêem seu trabalho
e ele tem importância para elas. Você leciona, seus estudantes precisam de você
e se importam com você. Você tem amigos que a amam. Até seus pais e irmãs a
amam – a seu modo singular.
Eu: - Nada
disso diminui minha solidão um só milímetro. Não tenho homem. Não tenho filho.
Eu: - Mas
você sabe que os filhos não são antídoto para a solidão.
Eu: - Sei.
Eu: - E você
sabe que os filhos só pertencem temporariamente aos pais.
Eu: - Sei.
Eu: - E
você sabe que os homens e as mulheres jamais poderão possuir-se, uns aos
outros, por completo.
Eu: - Sei.
Eu: - E
você sabe que detestaria ter um homem que a possuísse por completo e usasse o
seu espaço mínimo de respirar...
Eu: - Sei... mas anseio desesperadamente por isso.
Eu: - Mas
se você o conseguisse, ia sentir se presa.
Eu: - Sei.
Eu: - Você
quer coisas contraditórias.
Eu: - Sei.
Eu: - Você
quer liberdade e quer também proximidade.
Eu: - Sei.
Eu: - Pouquíssimas
pessoas encontram isso.
Eu: - Sei.
Eu: - Por
que esperar ser feliz quando a maioria das pessoas não é?
Eu: - Não
sei. Sei, apenas, que se parar de contar com o amor, parar de esperá-lo, parar
de procurá-lo, minha vida vai ficar tão vazia quanto um seio canceroso, depois
da extração cirúrgica. Eu me nutro dessa expectativa. Alimento-me dela. Ela me
mantém viva.
[...]
segunda-feira, 2 de julho de 2012
segunda-feira, 25 de junho de 2012
Jack Kerouac
Trechos de "Os subterrâneos"
[...]
- pois também a grandeza morre – ah e quem disse que eu sou
grande – e se fosse mesmo um grande escritor, um Shakespeare secreto dos
travesseiros noturnos? ou isso mesmo – um poema de Baudelaire não vale o
sofrimento dele – o sofrimento dele – (Foi Mardou que acabou me dizendo, “Eu
preferia o homem feliz aos poemas tristes que ele deixou” com o qual estou de
acordo e sou Baudelaire, e amo minha amante negra eu também me encostei em seu
ventre e ouvi os ruídos subterrâneos) – mas eu devia ter entendido quando ouvi
sua primeira proclamação de independência que era sincera a repulsa dela a
qualquer envolvimento, em vez de me jogar a ela como se e porque eu queria
mesmo me machucar e me “lacerar’ – mais uma laceração e vão ter que preparar o
caixão para mim rapaz – pois a morte já dobra suas grandes asas sobre minha
janela, eu a vejo na frouxidão das camisas que jamais usarei, novas-velhas,
na-moda-fora-de-moda, gravatas ofídicas que nem uso mais, cobertores novos para
leitos pacíficos outonados transformados em macas estrebuchantes inquietas
sobre o mar suicida – perda – ódio – paranóia – era o rostinho dela que eu
queria penetrar, e o fiz –
[...]
nenhuma menina jamais me havia comovido com uma história de
sofrimento espiritual a alma dela transparecendo tão lindamente como um anjo
perambulando pelo inferno e o inferno eram as mesmas ruas que eu perambulava
procurando, procurando alguém como ela sem nunca imaginar a escuridão e o
mistério e eventualidade do nosso encontro na eternidade, a imensidão do rosto
dela agora como um cartaz pregado numa cerca de madeira nos terrenos baldios de
lixos fumegantes em manhãs de sábado sem escola, direto, lindo, louco, na
chuva. – Nos abraçamos, apertamos com força – agora era como amor, fiquei
maravilhado – transamos na sala, felizes, nas cadeiras, na cama, dormimos
enrodilhados, satisfeitos – eu ia mostrar mais sexualidade a ela –
[...]
“Amor você que sabe”, é o que ela está dizendo, “quantas
vezes vai me ver e essas coisas- mas eu quero ser independente como eu já
disse.”
E eu vou para casa tendo perdido o amor dela.
E escrevo esse livro.
sábado, 2 de junho de 2012
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